Saúde de idosos opõe partidos e decide eleição nos EUA


De Nova York
Aparentemente, não há nada de especial no vigésimo-sexto distrito eleitoral do estado de Nova York.
Tradicional reduto da direita, a região que engloba áreas rurais dos subúrbios de Buffalo e Rochester vota em candidatos republicanos há quatro décadas, desde o primeiro governo Nixon. Lá, McCain venceu Obama com folga em 2008.
Pois na terça-feira quem celebrava a vitória na eleição especial para o cargo equivalente a deputado neste pedaço esquecido do estado mais populoso do nordeste dos EUA era a democrata Kathy Hochul. Ela capturou 47% dos votos, contra 43% da favorita, a deputada estadual republicana Jane L. Cowin, batendo na tecla de que o novo plano da oposição de alterar o programa de Saúde Pública Medicare – voltado para cidadãos com mais de 65 anos – seria um ataque criminoso à população idosa.
Os cortes no Medicare fazem parte da campanha de redução do déficit público defendida pelo líder da maioria na Câmara dos Representantes, o republicano Paul Ryan, e foi vetado na quarta-feira no Senado, de maioria democrata.
Mas mais do que a vitória previsível na Câmara Alta do Congresso americano, os democratas celebraram estas semana o que já consideram ser a tática populista a ser utilizada nas eleições gerais de 2012: a de apresentar os republicanos como o partido defensor do abono ao pagamento de impostos dos mais ricos enquanto ataca os benefícios da classe média idosa.
Resta saber se o discurso do medo será mais forte do que o dia-a-dia cada vez mais árido de uma economia ainda marcada pelo desemprego e um crescimento com ritmo de tartaruga.
“Os republicanos acusam os democratas de agirem de maneira demagógica, o que seria engraçado se não fosse patético. Afinal, a direita apresentou a reforma da saúde pública instituída pelo governo Obama como um ataque aos direitos da parcela mais madura da população, uma mensagem que ecoou fortemente nas eleições de meio-termo”, lembra Andrew Leonard, um dos editores do prestigioso site “Salon”.
No ano passado, sob forte ataque da direita, os democratas perderam o controle da Câmara dos Representantes para os republicanos.
O Medicare foi criado em 1965, durante a administração Lyndon Johnson, quando apenas metade dos americanos na terceira idade contava com algum tipo de plano de Saúde. Hoje, este é o único setor da sociedade civil da maior economia do planeta a contar com um serviço público universal de atendimento médico.
Além dos cidadãos com mais de 65 anos, o Medicare também beneficia pessoas mais jovens com deficiência física e doenças crônicas. O governo estima que em 2018 quase 60 milhões de americanos irão usar o Medicare. E especialistas garantem que o custo médio do serviço por pessoa subirá, nestes sete anos, dos atuais US $ 11 mil para US$ 17 mil.
Uma conta imensa, mas, como lembraram os democratas, “tirar o direito dos velhinhos e dos doentes” é uma mensagem poderosa, revelada na campanha pela vaga de deputado no oeste do estado de Nova York.
Não por acaso, os pais de Hochul, aposentados, fizeram centenas de ligações telefônicas para famílias da região, dividindo com virtuais eleitores as angústias de uma realidade sem o Medicare.
O Plano Ryan prevê, na prática, o término  da cobertura integral e oferece vouchers aos usuários do Medicare, que passariam a pagar os planos de saúde por eventuais serviços médicos, mantendo algum subsídio governamental.
A questão se tornou central no debate sobre o déficit público dos EUA, por conta do crescimento da população idosa no país. Com o envolvimento na disputa regional de políticos de calibre nacional, como o vice-presidente Joe Biden e o ex-presidente Bill Clinton, a área rural do extremo ocidental do estado de Nova York – similar, em sua estrutura física e humana, à parcela dos EUA com maior resistência à propaganda de Barack Obama – se tornou o surpreendente pulmão de uma possível recuperação democrata.
Sem grandes adversários na eleição presidencial – os nomes mais fortes apresentados pelos republicanos até o momento, os ex-governadores Mitt Romney, Tim Palenty e Jon Huntsman, não parecem galvanizar o eleitorado de direita, e a opção mais popular, a também ex-governadora Sarah Palin, ser vista como uma figura sectária – Obama começa a ver uma luz no fim do túnel na possibilidade de recuperar o controle do Congresso.
Mas Leonard pisa no freio e lembra que antes de pensar em retomar o controle da Câmara dos Representantes, os democratas precisam retomar as rédeas da economia.
“A indústria retraiu, o setor imobiliário está moribundo, o desemprego segue altíssimo e a expectativa de crescimento do PIB no segundo quadrimestre do ano caiu de 3,2% para 2,8%. Se a economia continuar medíocre no raiar de 2012, o Plano Ryan será esquecido e Obama não será reeleito”, aposta.