Morre no Rio o jornalista Rogério Marinho



 O jornalista e vice-presidente da Infoglobo, Rogério Marinho, morreu às 6h48m desta segunda-feira no Hospital Samaritano, em Botafogo, de insuficiência respiratória aguda. Rogério, que tinha 92 anos, estava internado desde a última quarta-feira. O velório será no Cemitério São João Batista, a partir das 14h30m, na capela 1, na Rua Real Grandeza. Ele deixa a mulher, dona Elizabeth, com quem foi casado por mais de 60 anos, filha e netos.

Em nota oficial, o governador Sérgio Cabral lamentou a morte do jornalista: "Rogério Marinho, ao lado de Roberto Marinho, contribuiu para a construção do maior grupo de comunicação do Brasil, que o Rio tem a honra de sediar. Desde o início da minha carreira pública recebi de Rogério Marinho manifestações de estímulo e atenção. Guardo dele boas lembranças. Meus sentimentos aos seus familiares".
O carioca da rua do Riachuelo Rogério Pisani Marinho só assinava Rogério Marinho. Tal como o irmão mais velho, Roberto Marinho. Nascido em 15 de maio de 1919, era o filho caçula do jornalista Irineu Marinho. Embora tenha perdido o pai quando tinha apenas seis anos, sua vida seria indissoluvelmente ligada à trajetória do GLOBO e das Organizações Globo.
Rogério Marinho chegou a flertar com as Ciências Jurídicas, entrando para o curso de Direito. Mas muito cedo, aos 18 anos, começou a trabalhar no GLOBO, a convite do irmão. Em depoimento ao projeto Memória Globo, Rogério Marinho descreveu a atividade jornalística naquela época:
"Era um jornalismo heróico. Não era esse jornalismo de hoje, tecnológico. Era um jornalismo de esforço pessoal, cada um fazia o que devia fazer e o que outros deviam fazer também, para não atrasar o jornal. E O GLOBO era completamente diferente de hoje".
Um homem suave, simples, que cumprimentava a todos os funcionários e não fazia distinção entre cargos, Dr. Rogério, como era chamado por todos no jornal e demais empresas do grupo, participou dos acontecimentos que marcaram, em nosso país, boa parte do século XX. Foi repórter na área de esportes, redator, diretor-substituto e, finalmente, vice-presidente. Muitas vezes, foi o responsável pela primeira página. Dessas ocasiões, lembrou em seu depoimento ao projeto Memória Globo:
"Nessa época, eu chegava à redação entre 3h30m e 3h45m e já encontrava uma pilha de papéis na minha frente. Fazia o trabalho de seleção, reduzia ou ampliava o que fosse necessário e apurava, toda aquela trabalheira. Depois, dedicava-me à primeira página. Às vezes, essa tarefa era realizada pelo Lucídio de Castro, nosso secretário".

Como todo jornalista, Dr. Rogério enfrentou os dilemas típicos de um dia normal de fechamento da edição, e descreveu desta maneira a sua experiência:
"Era comum o Alves Pinheiro chegar na última hora, quando já estava pronta a primeira página e dizer: 'Sensacional! Furo! Ninguém tem!'. Apontava um calhamaço que ele escrevia a mão, umas 10, 20 páginas. Eu dizia: 'Pinheiro, mas a essa hora?' 'Isso não pode deixar de sair', ele argumentava. Sentava-me, então, à máquina e reduzia o texto de forma a caber na página. Recorria ao linotipista, que era sensacional. Estávamos no prédio novo (do GLOBO), mas o sistema de linotipia ainda vigorava. Eu pegava o chumbo, ia compondo, sem fazer revisão nenhuma".

Um defensor da natureza
Um dia, Dr. Rogério, que na infância usava atiradeira e uma espingarda calibre 22 para matar camaleões no morro, descobriu a necessidade de preservar o meio ambiente. Nas suas palavras, "comecei a ver a vida, o que significava aquilo; estava simplesmente matando vidas". E a valorização e a defesa da natureza passaram a ser uma de suas grandes preocupações, que o levaram à Amazônia, a Roraima, à Serra do Tumucumaque, ao Pantanal, ao sertão da Bahia. A preocupação com o meio ambiente chegou, claro, à redação do GLOBO. Além do jornalismo e da ecologia, outra paixão de Dr. Rogério era o Fluminense. Mesmo quando estava em viagens, ele costumava ligar para a redação para saber o resultado de jogos do seu time do coração.
Um homem que se manteve sempre em atividade, muito depois da fase "heróica" do jornal, ele costumava chegar ao GLOBO às 11h30m, para o almoço com amigos de longa data no jornal, e ali permanecia até o fim da tarde. Assim ele descrevia sua relação com os jornalistas a ele subordinados:
"Se acho que é necessário fazermos um artigo, peço ao Luiz Garcia: 'O que você acha de nós fazermos isso?' Não digo: 'Faça o artigo'. Ou para o Merval (Pereira): 'Faça essa reportagem'? Não, mas sim: 'Merval, que tal você acha de fazermos essa reportagem?"


Rogério Marinho conviveu com gerações e gerações de jornalistas. Ressaltava constantemente que Roberto Marinho o marcou muito. E falava também da influência recebida de Pinheiro de Lemos, articulista, de Mário Filho, editor de esportes e autor de uma crônica diária, de Evandro Carlos de Andrade, editor do jornal numa fase bem posterior, entre outros.
Dr. Rogério trabalhou sempre em conjunto com o irmão mais velho, como ele gostava de sublinhar:
"Eu sempre tive uma vida muito participativa com o Roberto, na época de montar a cavalo, de viajar. Eu era uma espécie de cumpridor do programa dele, cumpridor dos objetivos dele. Para ajudá-lo, não para substituí-lo definitivamente".
E frequentemente foi obrigado a tomar decisões importantes, quando Roberto Marinho estava no exterior, ou quando a comunicação entre os dois era difícil e demorada. Isso aconteceu, por exemplo, quando o comunicador Luís de Carvalho deixou a Rádio Globo e ele teve de, rapidamente, escolher um substituto. Optou por Haroldo de Andrade, e sua escolha se revelou acertada. Como lembrou, em depoimento ao projeto Memória Globo:
"Haroldo teve um programa diário interessante, e várias vezes eu atuei como seu conselheiro. Uma vez, convidaram-no a se candidatar a deputado. Ele perguntou minha opinião, eu achei que não devia e ele não aceitou".
Censura no Estado Novo, censura na Revolução de 1964. Esta é a pior situação para o jornalista, e Dr. Rogério tinha opinião firme sobre isso. Teve muito mais problemas no primeiro caso.
"Tínhamos um censor permanente no GLOBO, que chegava e dizia: 'Esta matéria sai, esta não sai'. Dominava completamente. Mas nós tínhamos o Cartier, que era muito hábil em fazer artigos anódinos. Ele fazia um artigo que parecia que estava elogiando mas, no fim, estava fazendo restrições. Ficava no meio termo, o que era bom para o GLOBO".
Havia um censor no jornal também na Revolução de 64. Assim Dr. Rogério se lembrava dele: "Ele dizia o seguinte: 'Olha, Dr. Rogério, eu vim aqui como enviado. Agora, nós não podemos nos exceder. Temos certeza que o GLOBO não o fará, de maneira que eu entrego nas suas mãos a censura, a orientação do jornal".