Categoria: Internet "um afeto que não se encerra"

Longevidade, Viagra e proliferação de divórcios mudaram as regras e recolocaram os idosos no jogo 


DÉBORA YURI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Da série de novidades e transformações recentes que contribuíram para tornar o idoso "visível e protagonista", como reza o jargão antropológico, o início da comercialização do Viagra, em 1998, é tido como marco. O medicamento anti-impotência simplesmente recolocou os homens mais velhos num jogo para o qual eles não eram mais escalados.

Outra mudança foi o fim do casamento do tipo até-que-a-morte-os-separe e a consequente proliferação dos divórcios. "Hoje, há uma grande quantidade de idosos que aprenderam a viver sozinhos ou estão com novos parceiros. A contracultura foi uma revolução contra os valores vigentes, era a contestação; o que acontece hoje com a terceira idade é outra revolução", diz o psiquiatra Luiz Cuschnir, coordenador do Grupo de Gênero do Envelhecimento do HC.

Sem reduzir o impacto de viagras e congêneres, o geriatra Clineu de Mello Almada Filho, da Unifesp, coloca outro tipo de medicamento no mesmo patamar: o antidepressivo. "Eles também melhoram muito a vida do idoso. Antes, a doença, cuja prevalência acima dos 65 anos chega a 25%, ficava mascarada como apenas mais um sintoma da velhice."

No lado da mulher madura, os avanços da medicina estética aparecem como um genérico menos poderoso do Viagra. "Eles também ajudam a tratar a autoestima. A gente acha uma besteira, porque supostamente não precisa disso. Mas o importante não é o que a mulher é, e sim o que ela pensa que é", afirma.

A mudança fundamental, porém, é que as pessoas estão vivendo mais. "Esse é o grande fenômeno, que acarreta mudanças políticas, culturais, de valorização da medicina preventiva", acha a antropóloga Elizabeth Mercadante. "Se alguém se aposenta aos 70 e vai viver até 90, o que fará nesse tempo Ninguém rejuvenesce, mas ninguém mais precisa ser um velho de dentes podres. Eles descobriram que têm o direito de se cuidar."

O risco é substituir o clichê do idoso descartado pelo uso por um estereótipo novinho em folha, o do velho-jovem. "A velhice deixou de ser a antecâmara da morte, mas ficou quase que idealizada. A sociedade exalta o idoso que faz plástica, toma Viagra e faz sexo, pratica esporte, estuda, viaja. Isso gera um fenômeno de exclusão social, porque frustra quem não vive assim por falta de dinheiro", ressalta a psicanalista Dorli Kamkhagi, autora de "Psicanálise e Velhice" (ed. Via Lettera, 2008).

Vender a terceira idade como uma Disneylândia é um equívoco até para quem tem condições financeiras de fazer tudo isso, diz a psicanalista. "Nos consultórios, há muitos homens e mulheres que entram em depressão aos 45 anos porque não sabem como serão vistos quando forem velhos."