Projeto institucionaliza mercado paralelo de precatórios

O relator do projeto que muda as regras de pagamento dos precatórios (dívidas decorrentes de sentenças judiciais), deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), institucionaliza, no seu texto, o chamado mercado paralelo desse tipo de dívida no País. O relator incluiu dois dispositivos na proposta entregue hoje à comissão especial da Câmara permitindo ao credor ceder, total ou parcialmente, seus créditos a terceiros e ainda convalidando todas as cessões de precatórios realizadas até a entrada em vigor da nova regra, com a promulgação da emenda constitucional. O projeto deverá ser votado na próxima semana na comissão especial.


O mercado paralelo ou secundário de precatórios surgiu movido pelo atraso na fila de pagamentos. Sem poder esperar pelo pagamento, o credor acaba vendendo seu crédito a escritórios especializados que foram criados em torno dessa atividade, com deságio que chega a 70% do valor. O comprador usa o crédito para pagar débitos e, caso seja aprovada a proposta em discussão, poderá passar também a comprar imóvel. Um dos artigos faculta ao credor a entrega de créditos em precatórios para a compra de imóveis públicos.


"O projeto privilegia os pequenos, os idosos e que têm créditos alimentícios. Os grandes credores precisam de uma saída", disse Cunha. Estima-se que haja atualmente um estoque de R$ 100 bilhões de precatórios não pagos pelos Estados e pelos municípios. Apenas os federais estão em dia.


PEC do calote


A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) considera as mudanças nas regras do pagamento dos precatórios um "calote". A entidade contesta a instituição de um limite anual para o cumprimento de decisões judiciais, o prazo de 15 anos para pagar os credores e a instituição de um leilão, que resultará em grandes descontos e em prejuízo para os credores, entre outras críticas.


Eduardo Cunha alterou parcialmente um dos pontos polêmicos da proposta aprovada pelo Senado em abril. Pelo menos 50% dos recursos que serão reservados aos precatórios serão destinados ao pagamento em ordem cronológica de apresentação. Os 50% restantes poderão ser pagos por meio de leilão ou por meio de câmaras de conciliação, onde as duas partes poderão entrar em acordo.


Cunha manteve o regime especial para a quitação da dívida pelos Estados e pelos municípios. Pelo regime especial, os Estados e os municípios poderão pagar as dívidas em atraso no prazo de 15 anos, com o valor a ser calculado com base em suas receitas líquidas. Cunha regionalizou esse porcentual, mudando o texto do Senado.


Será de 1,5% para os Estados e de 1% para os municípios do Norte, do Nordeste, do Centro-Oeste e do Distrito Federal e para os Estados de outras regiões cujos estoques de precatórios pendentes corresponderem a 35% do total das receitas líquidas. O porcentual será de 2% para os Estados e de 1,5% para os municípios das regiões Sul e Sudeste, cujos estoques de precatórios pendentes corresponderem a mais de 35% da receita corrente líquida.


Federalização


No projeto, o relator abriu caminho para que a União, a seu critério exclusivo e por meio de uma lei a ser aprovada pelo Congresso, assuma os débitos dos precatórios de Estados, Distrito Federal e municípios, para refinanciá-los.


Assim como no projeto do Senado, os débitos de natureza alimentícia de credores com idade acima de 60 anos ou portadores de doença grave terão prioridade. São aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez.