Japonês escapou das duas bombas atômicas
Ele tinha 29 anos e ficou surdo de um dos ouvidos.
Sabe aquela frase "um raio não cai duas vezes no mesmo lugar"? Existe um homem, um velhinho japonês, que deu um novo significado a esse ditado popular. Ele sobreviveu simplesmente às duas bombas atômicas. Escapou da primeira, em Hiroshima, escapou da segunda em Nagasaki e contou a história ao repórter Roberto Kovalick.
As cerejeiras cercam a casa onde vive Tsutomu Yamaguchi, um senhor de 93 anos, andar já cambaleante, um homem capaz de resistir a duas bombas atômicas.
Ao lado da filha, da neta e de um bisneto de 2 anos de idade, ele nos recebe com a hospitalidade japonesa. Insiste que a gente coma, enquanto conta a história dele, quase inacreditável.
Yamaguchi já foi tema de um documentário e, três anos atrás, recebeu uma homenagem nas Nações Unidas, em Nova York. Um documento comprova que o senhor Yamaguchi sobreviveu a duas bombas atômicas. Foi emitido pela prefeitura de Nagasaki que, em 1957, já havia reconhecido que ele estava na cidade quando a bomba explodiu. Este ano, houve o reconhecimento pela prefeitura de Hiroshima.
No documento está escrito que ele estava em um raio de três quilômetros dos locais onde caíram as duas bombas.
Yamaguchi era engenheiro e trabalhava para um estaleiro. No dia 6 de agosto de 1945, ele foi a Hiroshima a trabalho, quando o avião americano Enola Gay sobrevoou a cidade, jogando a primeira bomba atômica da história.
Yamaguchi conta que estava na rua e viu um brilho muito forte, uma explosão subindo pelos ares. “Por que fizeram isso? Essa é uma resposta que até hoje eu não sei. Milhares de pessoas morreram, velhos, crianças”, lamenta ele.
A explosão deixou Yamaguchi cego por alguns momentos e, até hoje, surdo de um dos ouvidos. "Surgiram manchas na pele, tenho muitas na barriga. Eu tinha 29 anos de idade”, lembra.
Mesmo ferido, Yamaguchi viajou 30 quilômetros até Nagasaki, onde morava, e se apresentou para trabalhar no estaleiro. Foi onde, três dias depois da bomba de Hiroshima, os americanos fizeram o segundo ataque atômico.
Eram 11 horas e 2 minutos da manhã quando a bomba explodiu a 500 metros de altura, exatamente sobre o local onde hoje existe um monumento. As ondas de calor e radiação foram se espalhando, como mostram círculos desenhados no chão, destruindo um terço de Nagasaki e matando ou ferindo 150 mil pessoas. O lugar explodiu a bomba virou um parque, construído para ser o símbolo da busca pela paz.
Yamaguchi conta que a maioria dos colegas havia ido para um abrigo com as famílias: "Minha mulher e meu filho de cinco meses também deveriam ter ido para o abrigo, mas ela decidiu ficar comigo no estaleiro. E foi lá no abrigo que bomba caiu. Todo mundo morreu. Os que ficaram no estaleiro sobreviveram".
A mulher morreu no ano passado. O filho, quatro anos atrás. Os dois de câncer, uma doença frequente nos sobreviventes das bombas. Mas a que ele atribui o fato de ter sobrevivido? Sorte, destino?
"O motivo de continuar vivo é espalhar uma mensagem de paz. Foi por isso que sobrevivi. Bomba atômica nunca mais", diz.
Tsutomu Yamaguchi contou que ficou muito feliz por ser reconhecido como duplo-sobrevivente. Significa que de certa forma nunca vai morrer. A mensagem dele vai continuar viva, mesmo depois que ele for embora.